Brasil e Itália trocaram prisioneiros: veio o “mensaleiro” Henrique Pizzolato – e vai um chefão da Camorra, a máfia napolitana especializada no tráfico internacional de drogas.

Pasqualle Scotti, o chefão da Camorra que teria sido trocado por Pizzolato.

Pasqualle Scotti, o chefão da Camorra que teria sido trocado por Pizzolato.

Os últimos capítulos da extradição de Henrique Pizzolato, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, condenado a 12 anos e 7 meses de prisão no processo do “mensalão” e que estava detido na Itália, foram marcados por intensas negociações de bastidores. A justiça e o governo italianos estavam dispostos a negociar Pizzolato em troca de dois de seus cidadãos no Brasil. Queriam aproveitar a oportunidade.

O primeiro deles era Cesare Batistti, acusado de terrorismo e quatro homicídios, condenado à prisão perpétua na Itália, um dos fundadores da organização de extrema-esquerda chamada “Proletários Armados pelo Comunismo” (PAC), grupo ligado às “Brigadas Vermelhas”. Fontes do Ministério da Justiça brasileiro dizem que essa troca estava fora de questão, porque Batistti tem status de refugiado político. O abrigo foi concedido pelo próprio presidente Lula, em fins de 2010. Foi um ato oficial no apagar das luzes, em 31 de dezembro. Dilma já estava eleita.

Cesare Batistti, italiano condenado à prisão perpétua em seu país.

Cesare Batistti, italiano condenado à prisão perpétua em seu país.

O segundo “alvo” dos italianos era um chefão da Máfia de Nápoles, mais conhecida como a “Nova Camorra Organizada”. A facção criminosa controla parte importante do tráfico mundial de drogas. Atua particularmente na compra de entorpecentes na América do Sul (é aliada do Comando Vermelho, do PCC e dos cartéis colombianos) e na África (associada aos traficantes nigerianos). Depois contrabandeia cocaína e heroína para a Europa ocidental e os Estados Unidos. O fundador da “Nova Camorra”, Pasqualle Scotti, um tipo parecido com o “Don Corleone” do cinema, havia fugido para o Brasil em 1985. Um ano antes, em 1984, tinha sido condenado por 22 homicídios. Escapou da cadeia em um escândalo de corrupção.

Esse personagem do crime organizado viveu clandestinamente no Brasil durante 30 anos, mais ou menos. Foi apanhado em Recife, onde tinha dinheiro e fartura. O DEA americano e o FBI informam que o bandido nunca deixou de controlar os negócios da organização, enquanto usufruía do calor nordestino. Foi preso em maio desse ano, quando a justiça brasileira já tentava, quase desesperadamente, extraditar Henrique Pizzolato. Foi muita sorte.

Pizzolato, quando ainda estava preso na Itália. Agora está no Presídio da Papuda, em Brasília.

Pizzolato, quando ainda estava preso na Itália. Agora está no Presídio da Papuda, em Brasília.

Os italianos, habilidosos nas lides diplomáticas, teriam colocado na mesa de negociações a extradição do mafioso. Em 21 de outubro deste ano, a partir de um relatório do ministro Luiz Fux, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o envio de Pasqualle Scotti para a Itália. Foi um processo de tramitação relâmpago, considerando a pauta dos casos na Suprema Corte. No dia seguinte – repito: 24 horas depois – os italianos autorizaram a vinda de Henrique Pizzolato para o Brasil.

Quem denunciou a tramoia foi o advogado de defesa de Pizzolato, Alessandro Sivelli, em entrevista à mídia mundial. Ele chegou a dizer que seu cliente estava “muito decepcionado com a Itália”. Como sabemos, o “mensaleiro” tem dupla cidadania, brasileira e italiana. Só aqueles mais ingênuos não conseguem perceber que foi assim mesmo que aconteceu.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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2 respostas para Brasil e Itália trocaram prisioneiros: veio o “mensaleiro” Henrique Pizzolato – e vai um chefão da Camorra, a máfia napolitana especializada no tráfico internacional de drogas.

  1. Rodrigo Sampaio disse:

    Globo dá sinais de que, se farsa ruir, Barbosa é quem vai pagar a conta
    Jornal Nacional denuncia que ‘escolhido’ pode ter fugido do controle
    Barbosa pode ver aliados virarem as costas, enquanto o processo do mensalão vai sendo desmoralizado
    Conquistada a condenação dos réus da Ação Penal 470, o chamado mensalão, a Globo agora quer transferir o ônus do golpismo para o STF, mais especificamente para Joaquim Barbosa. Não parece ser por virtude, mas por esperteza, que William Bonner passou um minuto no Jornal Nacional de quarta-feira (20) lendo a notícia: “Divulgada nota de repúdio contra decisão de Joaquim Barbosa”.

    O manifesto é assinado por juristas, advogados, lideranças políticas e sociais repudiando ilegalidades nas prisões dos réus do mensalão efetuadas durante o feriado da Proclamação da República, com o ministro Joaquim Barbosa emitindo carta de sentença só 48 horas depois das ordens de prisão.

    O locutor completou: “O manifesto ainda levanta dúvidas sobre o preparo ou boa-fé do ministro Joaquim Barbosa, e diz que o Supremo precisa reagir para não se tornar refém de seu presidente”.

    A TV Globo nunca divulgou antes outros manifestos em apoio aos réus, muito menos criticando Joaquim Barbosa, tampouco deu atenção a reclamações de abusos e erros grotescos cometidos no julgamento. Pelo contrário, endossou e encorajou verdadeiros linchamentos. Por que, então, divulgar esse manifesto, agora?

    É o jogo político, que a Globo, bem ou mal, sabe jogar, e Joaquim Barbosa, calouro na política, não. E quem ainda não entendeu que esse julgamento foi político do começo ao fim precisa voltar ao be-a-bá da política. O PT tinha um acerto de contas a fazer com a questão do caixa dois, mas parava por aí no que diz respeito aos petistas, pois tiveram suas vidas devassadas por adversários, que nada encontraram. O resto foi um golpe político, que falhou eleitoralmente, e transformou-se numa das maiores lambanças jurídicas já produzidas numa corte que deveria ser suprema.

    A Globo precisava das cabeças de Dirceu e Genoino porque, se fossem absolvidos, sofreria a mesma derrota e o mesmo desgaste que sofreu para Leonel Brizola em 1982 no caso Proconsult, e o STF estaria endossando para a sociedade a tese da conspiração golpista perpetrada pela mídia oposicionista ao atual governo federal.

    A emissora sabe dos bastidores, conhece a inocência de muitos condenados, sabe da inexistência de crimes atribuídos injustamente, e sabe que haverá uma reviravolta aos poucos, inclusive com apoios internacionais. A Globo sabe o que é uma novela e conhece os próximos capítulos desta que ela também é protagonista.

    Hoje, em tempos de internet, as verdades desconhecidas do grande público não estão apenas nas gavetas da Rede Globo, como acontecia na ditadura, para serem publicadas somente quando os interesses empresariais de seus donos não fossem afetados. As verdades sobre o mensalão já estão escancaradas e estão sendo disseminadas nas redes sociais. A Globo, o STF e Joaquim Barbosa têm um encontro marcado com essas verdades. E a emissora já sinaliza que, se ela noticiou coisas “erradas”, a culpa será atribuída aos “erros” de Joaquim Barbosa e do então procurador-geral da República, Roberto Gurgel.

    Joaquim Barbosa, homem culto, deve conhecer a história de Mefistófeles de Goethe, a parábola do homem que entregou a alma ao demônio por ambições pessoais imediatas. Uma metáfora parecida parece haver na sua relação com a TV Globo. Mas a emissora parece que está cobrando a entrega antes do imaginado.

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    • Carlos Amorim disse:

      Rodrigo,
      obrigado por seu longo comentário. Continue participando.
      A publicação do seu artigo não significa que concordamos integralmente
      com o que você escreveu. Mas esta é uma tribuna livre para a circulação de
      ideias e opiniões.
      Mais uma vez, obrigado.
      abs
      Camorim

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