Oito horas da manhã do dia 7 de abril de 2011. Hora e data entram violentamente para a história do Brasil. Um jovem ensandecido e cheio de ódio, Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos, invade a escola municipal Tasso da Silveira, no subúrbio carioca de Realengo, e dispara 66 tiros de calibre 32 e 38 contra alunos indefesos. Mata 12 e fere 28, alguns em estado grave. Ao escrever esse post, cinco estudantes ainda estavam internados, um à beira da morte.
Wellington trazia consigo farta munição. Poderia ferir ou matar outros 20 alunos. Mas foi surpreendido por três guardas de trânsito e baleado duas vezes, antes de se matar com um tiro na têmpora direita. Fim da tragédia? Não! Início da tragédia. A violência nas escolas brasileiras é uma epidemia. Vandalismo, tráfico de drogas, brigas, espancamento de professores e assassinatos no ambiente do ensino médio estão nas páginas da imprensa diariamente. Uma pesquisa revela que 70% dos alunos e professores já testemunharam ou foram vítimas de agressões nas escolas. (Para detalhes, ver “Assalto ao Poder”, Record, 2010.) E as nossas sonolentas autoridades não fazem nada a respeito.
O ataque contra o colégio Tasso da Silveira, apesar de praticado por um jovem com problemas mentais, foi um ato de terrorismo deliberado. E certamente influenciado por episódios ocorridos no exterior e largamente difundidos pela mídia brasileira. Wellington repetiu passo a passo o roteiro macabro desse tipo de atentado: levou meses planejando, obteve armas com facilidade, deixou vídeos e cartas anunciando o que iria fazer, agiu impiedosamente e – por fim – matou-se. Como todos os terroristas desse gênero, passou por uma infância vergonhosa e foi vítima de abusos na adolescência. Vingou-se de tudo. E – ainda por cima – desnudo o sistema. Se ele tivesse simplesmente se matado no escuro do quarto – o que também era uma hipótese no caso dele – teríamos sido poupados de uma vergonha que correu o mundo. Mas, não: Wellington produziu um massacre sem precedentes em nossa história educacional. Uma história triste, aliás. E pode ser repetido, porque o cenário não vai mudar.
Chocado o país, começa o oportunismo dos políticos. Pela voz do senador José Sarney, surge a proposta de um novo plebiscito para proibir a venda de armas no país, como se uma coisa tivesse relação com a outra. Essa mesma questão já havia sido derrotada em consulta popular, pelo voto direto, em 2006. Para Wellington, tanto faria se houvesse ou não esse tipo de proibição. Ele não comprou os dois revólveres em nenhuma loja de caça e pesca. As indústrias produtoras de armamentos informam, através de seu sindicato patronal, que 80% da produção se destina a vendas no exterior. Os restantes 20% abastecem instituições na área da segurança. A comercialização para o cidadão, ínfima, é vista pelos fabricantes como “um mercado fracassado” (Folha de S. Paulo, edição de 19 de abril de 2011).
Segundo dados da Polícia Federal e do Ministério da Defesa, há no pais cerca de 14 milhões de armas em mãos de civis (corresponderia a 7% da polulação). Metade sem registro. Foi nesse mar de sargaços que Wellington pescou um 32 e um 38. A proibição de vendas legais não mudaria o destino das crianças de Realengo. Ao invés de se dedicar ao estudo de uma legislação capaz de reduzir os índices de violência, nossos políticos se aproveitam do clima de comoção para obter espaço na mídia e dividendos eleitorais. Querem aparecer pela exceção – e não pela regra. E se passar a ideia de um novo plebiscito, provavelmente serão derrotados outra vez: o povo não aceita a ideia de desarmar o cidadão, enquanto os bandidos têm fuzis, metralhadores e foguetes. Os bandos de criminosos armados não usam mais revólveres 32 e 38.