STF vai confirmar o privilégio das elites

Ministro Roberto Barroso iniciou a divergência no STF

Ministro Roberto Barroso iniciou a divergência no STF

Na próxima quarta-feira o Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte de justiça do país, deve aprovar os “embargos infringentes” no julgamento do mensalão. Ou seja: vai admitir um tipo de recurso que já caducou na legislação brasileira, dando à defesa a oportunidade de um novo julgamento. É a confirmação de um privilégio que só serve para aqueles poucos que têm direito a julgamento pelo STF. Isto não vale para o cidadão comum em nenhuma outra instância do judiciário nacional. Está nas mãos do ministro Celso de Mello o voto final.
Na sessão de 12 de setembro, quinta-feira passada, o tribunal deixou todo o país em suspense, ao adiar por mais uma semana a decisão sobre o recurso final da Ação Penal 470, o chamado “escândalo do mensalão”. Cinco ministros votaram a favor e outros cinco contra os “embargos infringentes”, um tipo de medida da defesa que pode levar a novo julgamento 12 dos 25 réus já condenados a penas de prisão. Os ministros da Suprema Corte parecem não se dar conta de tudo o que está em jogo nesse caso: não apenas a liberdade dos réus, mas a própria credibilidade da Justiça. Cada voto se transforma num espetáculo para banhar o ego dos magistrados, com gestos teatrais e transmissão ao vivo pela TV.
Enquanto isso, o cidadão comum quer saber se haverá justiça ou não. Independentemente da fogueira dessas vaidades, questões de fundo do Direito estão em jogo, especialmente a ampla liberdade de defesa. Mas tudo tem limite. Ao que parece, o último ministro do STF escalado para o julgamento, Celso de Mello, só não votou, resolvendo finalmente a parada, porque também quer um palco iluminado. Quer brilhar diante das câmeras e microfones. Todo mundo respeita a erudição e a sapiência da Corte, mas ninguém aguenta o discurso enfadonho. É perda de tempo e sacrifício do dinheiro público. O processo do mensalão já consumiu cinco meses de trabalho do STF, no ano passado, e agora se arrasta no plenário por outros dois meses. Não é à toa que há 70 milhões de processos parados nos tribunais.
Como se trata de uma questão técnica – aceitar ou não os embargos infringentes – o resultado poderia vir mais rapidamente, poupando o público da interminável verborragia dos juízes. É claro que as decisões da Suprema Corte influenciam a prática processual em todo o país, mas isso não é motivo para abusar da paciência dos mortais. Essa questão já era para estar decidida há tempo. Além do mais, aceitar os embargos finais não significa mudar automaticamente os resultados e as condenações. Significa que vai começar tudo de novo. Ninguém, em bom juízo, pode ser contra o amplo direito de defesa, instrumento de proteção do cidadão contra abusos do poder. Mas, por que só para os poderosos a serem julgados no ambiente do STF? Por que não para todos nós?
Particularmente, creio que a Ação Penal 470 cometeu algumas poucas injustiças, mas acertou no conjunto. Luís Gushiken, por exemplo, foi acusado indevidamente. E depois absolvido. José Genoíno Neto merece a condenação, mas não a pena exacerbada que recebeu. Aliás, foi até elogiado pelo ministro Barroso. Agora temos que aguardar o último (ou penúltimo) capítulo da novela. E já não temos mais a paciência de antes.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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