
Patrícia Poeta, afastada do Jornal Nacional da TV Globo.
Fora o motorista e o trocador, somos todos passageiros. Nunca essa frase da linguagem popular foi tão perfeita para descrever a saída de Patrícia Poeta do Jornal Nacional. E – provavelmente – não é verdade que ela tenha sido escolhida como uma substituta de Fátima Bernardes com mandato de apenas três anos. Foi isso que a direção da TV Globo, a maior emissora brasileira, afirmou em comunicado oficial (15 set). Mas soa com a falsidade habitual das chamadas “notas oficiais”. O sábio Millôr Fernandes, certa vez, escreveu: “a notícia foi confirmada por um desmentido oficial”. Me parece que a máxima genial cabe perfeitamente nesse episódio.
Quando Patrícia Poeta foi anunciada para o lugar de Fátima Bernardes (dizem as más línguas que a Globo queria separar o casal Fátima-Willian Bonner da bancada do JN), a alta direção do jornalismo platinado deu entrevista coletiva, transmitida em circuito fechado de TV, para dizer que a Patrícia era uma unanimidade entre os crachás mais poderosos da emissora. Carlos Henrique Schroder, hoje diretor-geral da emissora; Ali Kamel, diretor-geral de jornalismo; Silvia Faria, diretora executiva da área; e o próprio Wilian Bonner haviam concordado com a substituição. Portanto, publicamente, uma unanimidade. Na ocasião (dezembro de 2011), ninguém falou em mandato-tampão.
A bela Patrícia emprestou leveza e charme ao telejornal sisudo, até careta mesmo. Um telejornal cujo chefe se assina como “editor chefe e apresentador”, como se as duas funções se equivalessem. Ela é das mais seguras apresentadoras do gênero. O sonho de consumo de qualquer editor-chefe, pela firmeza na narração, capacidade de improvisar e de superar falhas eventuais. Mas – para tristeza dela – o editor-chefe do JN é um concorrente na apresentação. E ainda por cima marido da ex-apresentadora Fátima Bernardes. Que situação! Para nós, reles telespectadores do Jornal Nacional, que durante a ditadura era conhecido como “a agência nacional televisiva”, resta a surpresa.
É claro que a Patrícia Poeta não era nenhuma sumidade, nada comparável aos históricos “ancoras” americanos, como o inesquecível Dan Rather, da CBS, de cujo exemplo surgiu aqui no Patropi essa mania de chamar de “ancora” um mero apresentador. Não era nenhuma jornalista notável, mas era esforçada, lia e pesquisava os temas do telejornal, e participava dele com a maior simpatia. O público, como este locutor que vos fala, há de sentir falta da moça. Mas, no Império Global, as coisas são assim mesmo: substitui-se competência por obediência. Bem à imagem de seu Criador.
Patrícia Poeta protagonizou algumas patacoadas, na Copa do Mundo, na entrevista com Marina Silva etc. Mas não foi obra dela. É só o TP apagar que todos viram anões. Alguém escreve e manda executor o “pataquismo”.
Aliás, exilar jornalistas na Globo News, uma espécie da “Sibéria Global”, virou rotina. E o público que se dane. Coisas como essas explicam – e justificam – o lento e inexorável declínio da emissora. Causa principal: o desrespeito com a inteligência do telespectador.
Sobre Carlos Amorim
Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão.
Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano.
Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc).
Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes.
Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005).
A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações.
Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada.
Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.