Polícia Militar do Rio sofre 102 baixas só este ano, supostamente em choques com o crime organizado nas chamadas “áreas pacificadas”. Ou seja: favelas e bairros pobres dominados pelo narcotráfico.

Policiais em ação na favela.

Policiais em ação na favela.

De janeiro até agora, a PM do Rio de Janeiro sofreu 102 baixas fatais e um número não divulgado de feridos a bala. A notícia está nos sites nesta quinta-feira (27 nov). Na guerra civil não declarada em curso na Cidade Maravilhosa, 85 policiais foram mortos em dias de folga, quando prestam serviços de segurança particular, os chamados “bicos”, que são tolerados pelo governo local como forma de complementação de renda. Outros 17 PMs morreram em serviço, a maioria nas áreas onde estão implantadas as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), algumas das quais com apoio das Forças Armadas. Em geral, segundo  as estatísticas, para cada policial morto, ocorrem dez vezes mais mortes de civis nos confrontos entre as forças da lei e o crime organizado.

Esses números revelam a intensidade do enfrentamento, jamais reconhecida publicamente pelas autoridades. Os inimigos, facções criminosas organizadas, atendem pelos nomes de Comando Vermelho (CV), Terceiro Comando (3C), Amigos dos Amigos (ADA) e grupos paramilitares autodenominados “milícias”, a maior das quais se chama “Liga da Justiça”. O clima de guerra, com a presença ostensiva do Exército e dos Fuzileiros Navais em algumas comunidades, contradiz o projeto de “pacificação” iniciado há uns seis anos e que resultou na ocupação policial-militar de umas 40 favelas, num universo de cerca de 1.100 comunidades pobres da região metropolitana do Rio. As Unidades de Polícia Pacificadora deram certo em algumas áreas, contanto, inclusive, com apoio da população. Mas – na maioria dos casos – significou apenas uma ocupação militar, uma espécie de “pequeno Estado de Sitio” sobre gente pobre, cujos direitos constitucionais não são respeitados.

Forças Armadas no Complexo do Alemão, Rio.

Forças Armadas no Complexo do Alemão, Rio.

Na maioria das áreas ditas “controladas pelo Estado”, há seguidas e rotineiras denúncias de violência e abusos contra os moradores. Inclusive abusos sexuais contra jovens. Em 76% das UPPs, conforme recordo, houve denúncias de corrupção, extorsão, sequestros e assassinatos praticados por PMs. O acúmulo dessas denúncias resultou no afastamento recente da cúpula da Polícia Militar fluminense. As UPPs são mais um projeto político do que social, que conta com o apoio da grande mídia. Mas cujos resultados são pífios.

Uma difícil convivência entre as forças da lei e a população.

Uma difícil convivência entre as forças da lei e a população.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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3 respostas para Polícia Militar do Rio sofre 102 baixas só este ano, supostamente em choques com o crime organizado nas chamadas “áreas pacificadas”. Ou seja: favelas e bairros pobres dominados pelo narcotráfico.

  1. Alan Souza disse:

    Só pra efeito de comparação, o NYPD – New York City Police Department, a maior força policial dos EUA, registra desde sua fundação (1845) um total de 814 mortos no cumprimento do dever. A segunda maior força policial dos EUA é o CPD – Chicago Police Department, que foi fundado em 1855 e desde então teve 510 mortos em ação. A 3ª maior força policial é o LAPD – Los Angeles Police Department, que foi fundado em 1869 e até hoje teve 204 policiais mortos em ação.

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  2. José Antonio Severo disse:

    Os números apresentados nesta reportagem de Carlos Amorim mostram claramente a que ponto chegou o confronto entre as forças (policias e bandidos) que disputam a hegemonia nas periferias das duas grandes capitais brasileiras, Rio e São Paulo.
    Aqui estão apenas as baixas dos funcionários do estado, mas, como diz, o número de civis é exponencialmente maior. Isto é normal, pois nas guerras modernas o número de vítimas é muito maior entre os circunstantes das áreas de confronto do que entre combatentes. Já se foi há muito o tempo em que as batalhas eram disputadas no corpo a corpo ou com armas de curtíssimo alcance, produzindo vitimas basicamente entre militares; ou então, falando das favelas, lutadas com os inesquecíveis Taurus .38 com suas balas de chumbo da CBC com pouco mais de 100 metros de alcance útil e impacto reduzido.
    Entretanto, creio que é inadequado chamar de guerra civil, pois não está em disputa o poder do estado. As forças antagônicas lutam pelo controle do território, pois nem mesmo o comércio da venda de drogas está em jogo neste caso. Os leitores que me desculpem a caricatura: as facções criminosas lutando entre si parecem-se com as potências navais da renascença brigando pelas rotas das especiarias do oriente em torno das feitorias. Ou, ainda: armadores portugueses, holandeses, franceses e espanhóis nas costas sul-americanas. Por aqui, no final, esgotados o estoque de pau brasil, Lisboa (o estado português) se impôs e por isto hoje escrevo na última flor do Lácio.
    O estado (com suas forças armadas e políciais) fica entre dois fogos, observando, digamos, que nem os estados do Oriente Médio, Iraque e Síria, estonteados pela luta feroz entre xiitas e sunitas nos desertos do Levante.
    É preciso, portanto, deixar de lado a hipocrisia e encarar a realidade. No terreno, há muita dificuldade para atuar de forma civilizada. A guerra em área urbana é letal e as vítimas civis são muito maiores do que entre os combatentes. Isto é estatístico. Para intervir com eficiência estratégica não há como evitar danos. Haverá muitas mortes. O número dos combatentes é pequeno, centenas de cada lado, mas o povo envolvido são milhões, abrigados em casas de alta vulnerabilidade, está exposto como os civis debaixo das bombas erráticas na Segunda Guerra.. É uma situação muito difícil. É preciso que a mídia deixe de lado a hipocrisia e não se deixe manipular pelos dois lados em conflito, pois tanto bandidos como polícias então movendo uma guerra psicossocial cujos objetivos ainda não são muito claros para um or distante como este comentarista. observad

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