A prisão de José Dirceu, nas primeiras horas da manhã de hoje (3 ago), parece representar mais um passo no longo processo de “desconstrução” do Partido dos Trabalhadores (PT), há 13 anos no poder, com Lula e Dilma. As investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, consolidadas na “Operação Lava-Jato”, que apura corrupção na Petrobras, é mais danosa ao partido do que o processo do “Mensalão”. Por que? Na Ação Penal 470 da Suprema Corte, se investigava a compra de apoio político para o primeiro mandato petista. Lula se reelegeu. Agora se apura, além da corrupção propriamente dita, o enriquecimento pessoal e criminoso do ex-ministro chefe da Casa Civil, homem forte do período Lula.
Dirceu é acusado de receber uma quantia que pode chegar a 39 milhões de reais, desviados da estatal do petróleo. Pior: recebeu por trabalhos nunca executados pela JD Consultoria, da qual seu irmão e sócio, Luís Eduardo de Oliveira e Silva, que também foi preso hoje, participava. Os pagamentos à empresa de “consultoria política” seriam uma forma de legalizar as propinas. O MPF afirma que o dinheiro serviu para pagar despesas de táxi-aéreo (ver a Folha online de hoje), comprar um imóvel para a filha do ex-ministro, fazer reformas e decoração em outro apartamento e coisas que tais. De acordo com acusação, José Dirceu, mesmo preso pela ação penal do “Mensalão”, continuava com suas “atividades criminais” e recebendo mais dinheiro. Este foi o motivo da decretação da sua prisão preventiva, executada hoje e assinada pelo juiz federal Sérgio Moro, que conduz a “Lava-Jato”.
Ou seja: acusações de cunho pessoal e não genéricas. Talvez – se confirmadas, até porque todo suspeito é inocente até ser julgado – não se trata de nenhum “projeto político”. Nenhum apoio ao governo: simples enriquecimento ilícito. E justamente por que são acusações contra a pessoa de Dirceu, o irmão dele e um assessor pessoal, se revestem de importante significado político. Como um cara como esse se tornou homem forte de governo (seria, provavelmente, o sucessor de Lula, se não fosse o “Mensalão”), chefe da Casa Civil da Presidência? Esta é a questão: a nova prisão de José Dirceu abre portas para investigar o próprio Lula. E terminar de destruir o PT. Quanto à Dilma, está longe de poder ser acusada.
No entanto, a “Lava-Jato” não causa prejuízos apenas ao governo. Nas próximas semanas, a Procuradoria Geral da República (PGR) deve apresentar denúncia contra os políticos, atingindo fortemente o Congresso e vários partidos. São dezenas de suspeitos. Afeta até mesmo os presidentes das duas casas legislativas. A denúncia vai instruir uma ação penal do STF. Isto é: a possibilidade de mandar deputados e senadores para a cadeia. Vai demorar, como tudo no judiciário brasileiro. Pode até ultrapassar a eleição geral de 2018. É quase certo. Mas a ameaça é considerável. O que pode acontecer no interregno?
Como esses políticos são jogadores espertos, verdadeiros mestre no xadrez, vão aumentar a pressão sobre o governo. É a chamada “pauta-bomba” no Congresso. De modo a encurralar ainda mais a presidente Dilma e produzir um ambiente de pressão no Judiciário e na PF. Querem aliviar a barra, constrangendo o Executivo por meio de sucessivas derrotas políticas. Na esperança e que isso possa aliviar as acusações. E não importa se tal postura é boa ou não para os interesses do país e do povo brasileiro. Querem salvar a própria pele. Que se dane se vão penalizar as contas públicas, naufragar o ajuste fiscal, demitir Joaquim Levi, supostamente no interesse dos trabalhadores. Querem livrar a própria cara.
Em Terras Brasilis, as coisas são mesmo assim: o conchavo além da lógica. Dom Pedro I, no episódio da “independência” de Portugal, em 7 de setembro de 1822, declarou-se “Imperador do Brasil”, em vez de declarar a República. Atendendo aos apelos de seu pai, o decrépito Dom João VI, tornou-se um vassalo “independente” dos lusitanos. Portugal era o país mais atrasado da Europa. Permeado pela corrupção. A herança dura até hoje.