Nova prisão de José Dirceu amplia a “desconstrução” do PT e agrava a crise política. Mas os políticos temem as consequências da “Operação Lava-Jato”, que vão atingir duramente o Congresso nas próximas semanas.

José Dirceu, peso hoje. Foto UOL.

José Dirceu, preso hoje. Foto UOL.

A prisão de José Dirceu, nas primeiras horas da manhã de hoje (3 ago), parece representar mais um passo no longo processo de “desconstrução” do Partido dos Trabalhadores (PT), há 13 anos no poder, com Lula e Dilma. As investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, consolidadas na “Operação Lava-Jato”, que apura corrupção na Petrobras, é mais danosa ao partido do que o processo do “Mensalão”. Por que? Na Ação Penal 470 da Suprema Corte, se investigava a compra de apoio político para o primeiro mandato petista. Lula se reelegeu. Agora se apura, além da corrupção propriamente dita, o enriquecimento pessoal e criminoso do ex-ministro chefe da Casa Civil, homem forte do período Lula.

Dirceu é acusado de receber uma quantia que pode chegar a 39 milhões de reais, desviados da estatal do petróleo. Pior: recebeu por trabalhos nunca executados pela JD Consultoria, da qual seu irmão e sócio, Luís Eduardo de Oliveira e Silva, que também foi preso hoje, participava. Os pagamentos à empresa de “consultoria política” seriam uma forma de legalizar as propinas. O MPF afirma que o dinheiro serviu para pagar despesas de táxi-aéreo (ver a Folha online de hoje), comprar um imóvel para a filha do ex-ministro, fazer reformas e decoração em outro apartamento e coisas que tais. De acordo com acusação, José Dirceu, mesmo preso pela ação penal do “Mensalão”, continuava com suas “atividades criminais” e recebendo mais dinheiro. Este foi o motivo da decretação da sua prisão preventiva, executada hoje e assinada pelo juiz federal Sérgio Moro, que conduz a “Lava-Jato”.

O ex-ministro, acusado de enriquecimento ilícito.

O ex-ministro, acusado de enriquecimento ilícito.

Ou seja: acusações de cunho pessoal e não genéricas. Talvez – se confirmadas, até porque todo suspeito é inocente até ser julgado – não se trata de nenhum “projeto político”. Nenhum apoio ao governo: simples enriquecimento ilícito. E justamente por que são acusações contra a pessoa de Dirceu, o irmão dele e um assessor pessoal, se revestem de importante significado político. Como um cara como esse se tornou homem forte de governo (seria, provavelmente, o sucessor de Lula, se não fosse o “Mensalão”), chefe da Casa Civil da Presidência? Esta é a questão: a nova prisão de José Dirceu abre portas para investigar o próprio Lula. E terminar de destruir o PT. Quanto à Dilma, está longe de poder ser acusada.

No entanto, a “Lava-Jato” não causa prejuízos apenas ao governo. Nas próximas semanas, a Procuradoria Geral da República (PGR) deve apresentar denúncia contra os políticos, atingindo fortemente o Congresso e vários partidos. São dezenas de suspeitos. Afeta até mesmo os presidentes das duas casas legislativas. A denúncia vai instruir uma ação penal do STF. Isto é: a possibilidade de mandar deputados e senadores para a cadeia. Vai demorar, como tudo no judiciário brasileiro. Pode até ultrapassar a eleição geral de 2018. É quase certo. Mas a ameaça é considerável. O que pode acontecer no interregno?

Como esses políticos são jogadores espertos, verdadeiros mestre no xadrez, vão aumentar a pressão sobre o governo. É a chamada “pauta-bomba” no Congresso. De modo a encurralar ainda mais a presidente Dilma e produzir um ambiente de pressão no Judiciário e na PF. Querem aliviar a barra, constrangendo o Executivo por meio de sucessivas derrotas políticas. Na esperança e que isso possa aliviar as acusações. E não importa se tal postura é boa ou não para os interesses do país e do povo brasileiro. Querem salvar a própria pele. Que se dane se vão penalizar as contas públicas, naufragar o ajuste fiscal, demitir Joaquim Levi, supostamente no interesse dos trabalhadores. Querem livrar a própria cara.

Em Terras Brasilis, as coisas são mesmo assim: o conchavo além da lógica. Dom Pedro I, no episódio da “independência” de Portugal, em 7 de setembro de 1822, declarou-se “Imperador do Brasil”, em vez de declarar a República. Atendendo aos apelos de seu pai, o decrépito Dom João VI, tornou-se um vassalo “independente” dos lusitanos. Portugal era o país mais atrasado da Europa. Permeado pela corrupção. A herança dura até hoje.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
Esse post foi publicado em Politica e sociedade. Bookmark o link permanente.

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s