Suprema Corte proíbe doações eleitorais de empresas a partidos e candidatos. A decisão é um duro golpe na corrupção política.

Plenário do STF: decisão saiu às cinco da tarde.

Plenário do STF: decisão saiu às cinco da tarde.

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na tarde desta quinta-feira (17 set): doações de empresas privadas a partidos políticos e candidatos, no período eleitoral ou fora dele, são ilegais e ferem a Constituição. Por ampla maioria (8 a 3), os ministros assentaram que o dinheiro farto das empresas representa abuso do poder econômico e desequilibra o jogo democrático. Foi um duro revés para o ambiente político nacional, marcado por tratativas inescrupulosas e todo tipo de fraudes. Os votos vencidos foram dos ministros Gilmar Mendes, Teori Zavascki e Celso de Mello.

Os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram contra.

Os ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram contra.

Citando a Carta da República, os magistrados afirmaram que as doações de empresas privadas significam uma espécie de compra do processo eleitoral. Um deles chegou a afirmar que “todo poder emana do povo e para ele deve ser exercido”. Ou seja: não para companhias que pretendem se beneficiar de obras públicas, empréstimos subsidiados (tipo BNDES) e outras vantagens. A decisão histórica foi em resposta a uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4650) proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Entra em vigor imediatamente, afetando as eleições municipais do ano que vem e, principalmente, as presidenciais de 2018.

O ministro Gilmar Mendes, na sessão de ontem (quarta, 16 set), falou sem parar durante cinco horas, apresentando argumentos contra a medida e provocando o adiamento da sessão. Rouco e exacerbado, chegou a dizer: “dessa maneira vamos criar um código eleitoral digno da Albânia”. O ministro, que já havia interrompido esse mesmo julgamento em 2013, ao pedir “vistas aos autos”, atrasou a decisão em um ano e meio. No voto de ontem argumentou: “foi a mão de Deus que me levou a pedir vistas, porque só assim pude entender a extensão do problema à luz da Lava-Jato”. Estranha declaração: a Lava-Jato apura exatamente a compra de políticos e agentes públicos por parte de empresas privadas, com dinheiro desviado da Petrobras e de outras fontes.

A sessão durou apenas três horas.

A sessão durou apenas três horas.

Gilmar Mendes, em seu voto de quase 100 páginas, acusou a OAB de estar a serviço do governo petista. Os advogados ficaram ofendidos, inclusive porque a ação é de 2009 e seu autor é opositor do governo. Mendes concentrou seus ataques no PT e em Dilma Rousseff, apesar de que em nenhum momento chamou a presidente pelo nome. Curiosamente, se esqueceu de dizer que as mesmas empresas que financiaram Dilma também financiaram Aécio Neves, com valores muito semelhantes. Em 2014, os gastos eleitorais atingiram extraordinários 4 bilhões de reais. No final, irritado, abandonou o plenário.

Na contramão dessa opinião, a ministra Rosa Weber declarou que as doações empresariais fazem das eleições “um jogo de cartas marcadas”. Transformam os eleitores em “fantoches”, segundo ela. O relator do processo, Luiz Fux, defendeu a tese de que o abuso do poder econômico cria uma espécie de poder paralelo, na medida em que as empresas passam a administrar parlamentares e governantes. Tudo em prol de seus próprios projetos – e em nome do lucro.

O esquema de corrupção política no país sofre, portanto, um grande revés com a decisão do STF. Boa parte da bancada de oposição no Congresso foi contra, incluindo o PSDB, o DEM, os ruralistas e os evangélicos radicais. Coisa curiosa, porque são eles que acusam o PT de levar “bola” das empresas privadas.

O debate no Supremo foi uma aula de direito e democracia. Um dia glorioso para o judiciário brasileiro.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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3 respostas para Suprema Corte proíbe doações eleitorais de empresas a partidos e candidatos. A decisão é um duro golpe na corrupção política.

  1. Baumann disse:

    Será que iniciamos a plantação de um laranjal?

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    • Carlos Amorim disse:

      Querido amigo:
      é claro que não estamos plantando um laranjal. A questão é a seguinte: após a decisão de ontem, irrecorrível, o empresário que quiser continuar a corromper o sistema eleitoral terá que adentrar definitivamente o campo do crime organizado. Seja por verbas secretas, laranjas, empresas de fachada etc. Só que agora isso dá cadeia. É só perguntar, meu amigo, aos tubarões que estão em cana lá em Curitiba. Foi nisso que avançamos. Se quiser insistir, insista. Mas terá consequências.
      Mas, como já disse um famoso jurista alemão, “cria-se uma lei e imediatamente cria-se uma fraude”. O mundo é assim mesmo.
      Forte abraço,
      Camorim

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      • Baumann disse:

        Na floresta amazônica avista-se um Sumaúma de longe, mas um pé de laranja não, menos ainda o seu fruto. Sou cético.

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