Marina Silva, perdida como cego em tiroteio, dá sinais de reaparecer. Não se sabe se é parte da nova direita – ou se é uma nova esquerda saindo da direita. Confusão total.

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Marina Silva reaparece.

Meu amigo Pinheiro do Vale, velho combatente do jornalismo épico, porém aposentado, é uma figura célebre em Brasília. Conversa com ministros, frequenta gabinetes refrigerados, troca emails com os detentores do poder. Entre as nossas afinidades está essa mania desagradável de entender as coisas da política com base na história do país. Vale acaba de me mandar correspondência comentando a reaparição de Marina Silva. Ela deu entrevistas para rádios e televisões, apareceu nos grandes jornais. Pinheiro acompanha tudo. E – fiel às origens – faz paralelos com o passar do século. O amigo sempre tem uma abordagem nova sobre a política – mas não necessariamente concordo com tudo o que ele escreve. No entanto, aposto que o leitor do site vai se deleitar com a narrativa fluente e sarcástica. É claro que ele não me autoriza a publicar. Aí está a graça do jogo. Acompanhe o último comentário:

“Conservar melhorando. Era o lema dos jovens radicais republicanos que formavam um clube subversivo na Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em São Paulo, nos idos de 1880. Um de seus líderes mais consequentes era um jovem gaúcho gago, Júlio de Castilhos. A Faculdade de Direito foi o berço da República Velha, que vigorou entre 1894 e 1930. Todos os presidentes desse período foram graduados nessa escola. Também foi Castilhos quem fez uma leitura muito particular das teorias do filósofo francês Auguste Conte e implantou um regime político que mudou o Brasil, o Castilhismo”.

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A candidata precisa explicar a que veio.

Pinheiro do Vale acrescenta:

“Dito isto, passo a falar da entrevista da candidata Marina Silva, em Ribeirão Preto, São Paulo. Reverberou em todo o país pelas redes sociais e nas mídias eletrônicas, antes de chegar à imprensa de papel. A entrevista relançou a líder ‘sustentabilista’ na linha de frente. Na visão castilhista, o lema ‘conservar melhorando’ seria expresso hoje pelo vocábulo ‘sustentabilidade’. A expressão se opõe ao ‘desenvolvimentismo’, uma visão humanista (ou utilitária) do uso dos recursos naturais.

“Para os conservadores (ou conservacionistas), a natureza é um patrimônio do planeta. Para aqueles outros, ditos desenvolvimentistas, o planeta pertence à espécie humana e deve estar a serviço de seu bem estar. Ou seja: seus recursos devem ser explorados até que o último humano tenha assegurada sua inclusão no extrato mais elevado da humanidade. Nos padrões brasileiros de hoje, como diz a presidente Dilma, seria algo como possibilitar a todos uma casa mobiliada e equipada com eletrodomésticos e um automóvel na garage. Um país de classe média, ela enfatiza.

“Para Marina, a agenda é outra. Casa comida e roupa lavada são consequência de um novo conceito de equilíbrio. Ela não se opõe ao crescimento –  em si -, mas este deve estar condicionado à demanda de todo o planeta. Sustentabilidade é crescer melhorando, como diziam os castilhistas. No limite, as populações que ainda não chegaram lá, devem esperar um pouco. Até que a exploração dos recursos naturais sejam submetida aos requisitos de novas tecnologias e equilíbrios. A produção maciça de alimentos e bens já passou do limite. Insistir nisso é levar o planeta à uma condição que pode destruir, em vez de promover, a maior parte da humanidade.

“Marina não é aceita à esquerda. É difícil saber o que ela pensa. Entretanto, o pessoal da sustentabilidade não tem, neste momento, outro nome para apresentar (aos eleitores) num prazo curto. Um ponto de contato ideológico entre os ‘neocastilhistas’ com a esquerda convencional é a rejeição ao capitalismo, mas o projeto da Rede não fala em luta de classes, um mantra das correntes esquerdistas de herança marxista. Contra ela, podem vir os nomes que se apresentam: Aécio Neves, Geraldo Alckmin ou, no limite, José Serra. Talvez um Ciro Gomes. Ou, inesperadamente, um Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF no caso do ‘mensalão’.

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Ela reaparece com disposição de entrar na briga: mas qual é o projeto?

“O Império acabou, entre muitas outras razões, pela falência dos partidos e o esgotamento dos agentes políticos tradicionais. A República presidencialista estaria em final de ciclo pela mesma razão? Melhor seria dizer o fim do presidencialismo de coalizão, caminhando para um parlamentarismo ao estilo europeu. O sistema atual parece derreter-se, porque não consegue mais dar respostas às necessidades políticas do Estado. Estamos diante do fim de uma Era, às vésperas da ‘Terceira República’, dessa vez sustentabilista?”.

Vejam, caros leitores, que o nosso Pinheiro do Vale propõe questões a perder de vista. Coisas como a mudança de regime, com base na experiência histórica brasileira: sem rupturas traumáticas. Marina Silva e a salvação da Amazônia – ou a salvação dos empregos e da renda com base em políticas econômicas mais agressivas? Quem viver, verá!

 

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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2 respostas para Marina Silva, perdida como cego em tiroteio, dá sinais de reaparecer. Não se sabe se é parte da nova direita – ou se é uma nova esquerda saindo da direita. Confusão total.

  1. ah! o avião, o avião e o avião….. (seria Shakespeare em Macbeth?)

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  2. ah! o amanhã, o amanhã e o amanhã ( seria Shakespeare em Macbeth?)

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