Assassino em série assusta a zona sul de São Paulo. Depois de seis homicídios em uma mesma área, polícia monta força-tarefa para pegar o “Serial Killer do Grajaú”.

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Um “serial killer” na periferia de São Paulo?

                                            Um criminoso selvagem e misterioso está matando uma pessoa a cada cinco dias no bairro do Grajaú, extremo sul da capital paulista. Entre 26 de dezembro do ano passado e 31 de janeiro deste ano, foram dois homens e quatro mulheres. Os crimes, brutais, estão sendo investigados pela Homicídios (DHPP) e mais quatro delegacias da região. A polícia diz que se trata de um assassino em série, porque identifica várias características comuns aos seis casos, como se os crimes tivessem apenas um autor.

                                            A principal marca de um “serial killer” é a sua “assinatura”: em todos os ataques ele repete o mesmo tipo de agressão (modus operandi) e suas vítimas têm semelhanças físicas ou comportamentais. Na mente de um “serial killer”, mesmo que tenha eliminado 50 pessoas, ele está sempre “matando” a mesma vítima, como se fosse a mesma pessoa. No caso do Grajaú, as seis vítimas estão envolvidas com drogas e prostituição.

                                            As quatro mulheres eram garotas de programa – entre os homens mortos, um era travesti. Todos tinham cordas, ou fios elétricos ou cabos metálicos amarrados ao pescoço, indicando algum grau de esganadura. Os peritos encontraram sinais de violência sexual. Alguns tiveram partes dos corpos carbonizadas. Apenas uma mulher tinha ferimento compatível com um tiro na cabeça. O criminoso não tentou esconder os corpos. Ao contrário, uma das vítimas foi largada no meio da rua, como se fosse de propósito. Essa é outra característica do “serial killer”: ele quer reconhecimento público para a sua “obra”.

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O mais famoso “serial killer” do país ainda está preso.

                                            Mais um detalhe curioso, que aumenta o mistério em torno do criminoso: as ruas onde os corpos foram encontrados têm nomes incomuns, até estranhos. Uma delas se chama Estrela que Brilha, outra é a Rua Constelação do Caranguejo, ou a Rua Constelação do Erídano, ou a Rua Ana Velha. Observei os nomes ao estudar o mapa da área em que os corpos foram encontrados. Pode não significar nada, mas é bem esquisito.

                                            Antes dos crimes, o Grajaú já era um dos piores lugares para se viver em São Paulo. O distrito é pobre, com iluminação deficiente e lá não existe aquela abundância de câmeras de vigilância que se observa em lugares mais abastados. Não há testemunhas e não foi possível fazer um retrato falado do assassino. Dentre as seis vítimas, cinco eram conhecidas da polícia: drogas e prostituição. A área dos crimes é relativamente pequena (cerca de 10 km2) e concentra a marginalia: viciados, traficantes, travestis, prostitutas, catadores, moradores de rua. É a “boca do lixo” do extremo sul.

                                            O bairro começou a crescer nos anos 1950. Hoje tem mais de 50 mil habitantes e pelo menos uma centena de favelas, com milhares de casebres e barracos. O ‘Mapa da Desigualdade”, elaborado pela “Rede Nossa São Paulo”, informa que o Grajaú é o pior lugar da capital paulista, tal a quantidade de problemas: da violência às inundações de verão. Entre 55 indicadores de qualidade de vida, o Grajaú tem 32 com a pontuação mais baixa. E agora, para completar o circo dos horrores, tem um “serial killer”.

                                            O FBI, a polícia federal americana, tem estudos aprofundados a respeito dos assassinos em série. Apesar de terem apenas 5% da população mundial, os Estados Unidos concentram 84% de todos os casos do gênero desde 1980. Os federais americanos dão algumas dicas importantes. O primeiro homicídio, por exemplo, geralmente ocorre em um lugar que o predador conhece bem, porque mora ou trabalha nas vizinhanças – ou porque o local faz parte de suas memórias de infância, ou porque é passagem obrigatória para o assassino. O “serial killer” tem distúrbios mentais ou neurológicos, ou as duas coisas, que o colocam na categoria das psicoses agudas, inclusive com delírios. Ele acredita que está cumprindo uma missão – e muitas vezes pode estar ligado a igrejas ou instituições sociais.

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Os mais famosos na história do FBI.

                                            Na imensa maioria dos casos, os assassinos em série sofreram maus tratos e abusos na infância. Pode ser (ou foi) interno de entidades que cuidam de menores. Quando era jovem, entre 8 e 10 anos, praticou violência contra outras crianças ou animais. Um dos pistoleiros de aluguel da Cosa Nostra, a Máfia americana, conhecido como “o homem de gelo” (Richard Kuklinski, 1935-2006 ), matou todos os cães e gatos do bairro pobre em que nasceu, na cidade de Nova Jersey. O gangster, que entrou para a lista de “serial killers” do FBI, disse ter assassinado mais de 200 pessoas.   

                                            A aparência pacata normalmente esconde o criminoso cruel, já que o assassino em série descrito pelos especialistas do FBI não tem emoções como as pessoas comuns. Não tem medo, nem pena de ninguém, nem arrependimento. Muitas vezes alega receber orientação divina. Ou diabólica. É provável que esteja ou já tenha estado em tratamento psiquiátrico. Vale observar se há hospitais ou ambulatórios psiquiátricos na região dos crimes, porque o matador pode ser um de seus pacientes.

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Ao centro, Charles Mason. Ele comandou massacres na Califórnia.

                                            O FBI recomenda dar ampla publicidade aos crimes, por meio dos jornais, rádios e televisão. Além de eventualmente atrair alguma testemunha, a divulgação mexe com a cabeça do criminoso. Como o sujeito, em seu delírio, está em busca de reconhecimento, pode ser levado a cometer erros que ajudem na investigação. Alguns deles  procuram familiares das vítimas, escrevem cartas misteriosas e tentam “explicar” a sua brutalidade. Outros fazem contato com a polícia. Há em suas mentes, segundo os pesquisadores, um desejo de ser apanhado. Só assim o mundo entenderá a sua “obra”. Quem espera que o nosso criminoso em série seja  notável, pelo físico ou inteligência, está enganado: é um cara comum, parecido com qualquer outro.  

 

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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