Tráfico na fronteira movimenta 60 milhões de dólares por ano. A guerra entre facções brasileiras e cartéis paraguaios é pelo controle da venda de 60 toneladas de maconha e 10 de cocaína.

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PF queima maconha no Nordeste. Foto DRE/PF.

Superando eventuais divergências e desacertos comerciais, o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC), as maiores facções criminosas brasileiras, se uniram para controlar o tráfico de drogas na região de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul. A cidade faz  divisa com Pedro Juan Caballero e é vizinha de Capitan Bado, no Paraguai, onde estão os maiores atacadistas de maconha e cocaína da fronteira. É um negócio milionário. Todos os anos, 60.000 quilos de maconha e 10.000 quilos de cocaína colombiana pura atravessam para o Brasil – e uma parte menor vai para a Argentina e Uruguai.

Em valores atualizados, o tráfico rende 5 milhões de dólares por mês na fronteira: 60 milhões de dólares por ano. A preços da fronteira, a maconha paraguaia, considerada a melhor do continente, custa cerca de mil reais o quilo. Quando chega ao Rio de Janeiro, por exemplo, a cannabis é vendida a 150 reais o papel de 25 gramas – ou 6.000 o quilo. Em geral, a droga paraguaia e cotada no dobr0 do preço da brasileira, plantada no nordeste do país. Quando a maconha está “batizada”, misturada com outros resíduos, fica mais barata.

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Patrulhas na fronteira não impedem o tráfico. Foto DRE/PF.

Nos EUA e no Canadá, os maiores consumidores mundiais de drogas, a cocaína em estado puro custa 97 dólares o grama. Ou 97.000 dólares o quilo. Quanto mais longe da região produtora, a América Andina, a cocaína fica mais cara. Na Austrália e na Nova Zelândia, do outro lado do mundo, chega a custar 300 dólares o grama. Em termos globais, o tráfico de drogas movimenta algo parecido com 1 trilhão de dólares/ano. A Polícia Federal brasileira apreende anualmente certa de 40 toneladas de cocaína e mais de 300 toneladas de maconha e drogas sintéticas. E todo mundo sabe que a droga apreendida representa apenas 10% do movimento global.

Em termos globais, o relatório da ONU sobre drogas, divulgado no ano passado, apesar de ser considerado extremamente conservador nos números que cita,  apresenta o seguinte cenário:

“{Apesar da crise econômica}a prevalência do uso de drogas continua estável em todo o mundo, de acordo com o Relatório Mundial sobre Drogas de 2015 do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes. Estima-se que um total de 246 milhões de pessoas – um pouco mais do que 5% da população mundial com idade entre 15 e 64 anos – tenha feito uso de drogas ilícitas em 2013. Cerca de 27 milhões de pessoas fazem uso problemático de drogas, das quais quase a metade são pessoas que usam drogas injetáveis. Estima-se que 1,65 milhão de pessoas que injetam drogas estavam vivendo com HIV em 2013. Homens são três vezes mais propensos ao uso de maconha, cocaína e anfetamina, enquanto que as mulheres são mais propensas a usar incorretamente opióides {medicamentos derivados do ópio} e tranquilizantes”.

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O “Comendador” Arcanjo. Imagem de telejornal de Campo Grade.

Vale repetir: esse quadro apresentado pela ONU é contestado por estudiosos de todo o mundo, que apontam um número de usuários de drogas pelo menos duas vezes maior. De qualquer modo, o tráfico, sempre feito com dinheiro à vista, é o negócio de maior liquidez di planeta. Não é à toa que atraiu os nossos bandidos organizados para a fronteira. Já na metade dos anos 1990, um traficante brasileiro, ex-policial e bicheiro, João Arcanjo Ribeiro, o “Comendador”, assumiu o controle do tráfico na fronteira do Paraguai. E se tornou sócio de Fernandinho Beira-Mar, que representava o Comando Vermelho (CV). Os dois tiveram um violento desentendimento e FBM se refugiou na Colômbia, onde foi negociar diretamente com os produtores de coca.

A Justiça brasileira estima que o patrimônio do “Comendador” chegava a 1 bilhão de reais. Veja um trecho do relatório da “Operação Arca de Noé”, em 2004, que apanhou o criminoso:

“Dentre os bens de Arcanjo já apreendidos na operação, constam nada menos dos que 2.303 imóveis; uma fazenda com 3.768 hectares e outra de soja, com 8.260 hectares; um “Shopping Center”; três hotéis no país e um em Orlando, nos Estados Unidos. Além dos imóveis, foram apreendidos uma aeronave Cessna Citation, no valor de US$ 6 milhões; trinta outros veículos, 105 bens móveis, dentre joias e barras de ouro; e mais de seis mil itens correspondentes a ativos financeiros no país, que totalizam mais de R$ 38 milhões. Foram indisponibilizados também cerca de R$ 8,6 milhões que estavam depositados em contas correntes bancárias no país em nome do criminoso”.

O PCC, após a prisão de Fernandinho, também se deslocou para a fronteira. A organização se associou a um traficante de Pedro Juan Caballero, Carlos Antônio Caballero, o “Capilo”, que representou o PCC na região.  Foi preso, mas de dentro do presídio comandava o crime na fronteira. Ele teria ordenado a morte de Oscar Morel, traficante de armas, sócio da ADA, uma facção rival do Rio de Janeiro que também queria se instalar na região e foi impedida. Em Pedro Juan e Capitan Bado, o PCC comprou fazendas com pistas clandestinas. Em março de 2008, a facção paulista praticou uma chacina em Capitan Bado, executando sete pessoas suspeitas de terem denunciado um integrante da organização, Auxiliador Dias de Sousa, o “Cartão”, que foi preso pela DRE local. Foram mais de 100 tiros de M16.

O ponto alto desse conflito foi a execução cinematográfica do “Rei da Fronteira”, o dono da maconha paraguaia na região, Jorge Rafaat, o “Sadam. Ele foi emboscado no último dia 15 e assassinado com tiros de uma metralhadora ponto 50.

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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