
Forças Armadas na Rocinha. Imagem Agência Brasil.
Na manhã desta segunda-feira (23 out), a turista espanhola Maria Esperanza Gimenez, 67 anos, resolveu visitar a favela da Rocinha, campo de batalha entre facções criminosas. Aparentemente, contratou o tour em uma agência de viagens. Estava em um carro particular, sem qualquer sinal de que se tratava de um veículo de turismo. O motorista, supostamente, teria se recusou a parar em um bloqueio da tropa de choque da PM, no Largo do Boiadeiro, localidade movimentada da favela. E o que fizeram os policiais? Abriram fogo de fuzis automáticos contra o carro. Esperanza morreu a caminho do hospital.
Meia hora antes do incidente, que ganhou repercussão mundial, já tinha havido um violento enfrentamento entre policiais e traficantes, que resultou em dois PMs e um suspeito feridos. Quase ao mesmo tempo, dois outros tiroteios sacudiam o Morro do Chapadão e o Vidigal. Cenas da guerra civil no Rio de Janeiro, onde ocorre um enfrentamento armado a cada duas horas. O próprio ministro da Defesa, sem medir as palavras, já disse que tiroteio em favela é coisa do cotidiano das comunidades pobres. Como se a conflagração armada na segunda maior cidade do país não tivesse qualquer relevância. Raul Jugmann (PPS-PE, partido originário do antigo Partido Comunista Brasileiro, o PCB, hoje aliado de Temer) quer nos fazer acreditar que essas coisas são “normais”.

Violência nas ruas. Um país em guerra civil não declarada. Imagem da TV Brasil. ,
A política de segurança no Rio afundou de modo espetacular. As Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs), criadas há quase uma década, e que pretendiam recuperar os territórios ocupados pelo narcotráfico, fracassaram redondamente. Não passaram de um pequeno Estado de Sítio sobre as comunidades, no qual direitos civis básicos foram violados. Em 70% dos casos, houve denúncias de corrupção e maus tratos contra moradores. Os casos mais emblemáticos foram o sequestro, a tortura e o desaparecimento de Amarildo, na Rocinha, e o de um tenente do Exército que decidiu levar para casa dois aparelhos de ar-condicionado de um morador do Complexo do Alemão. Ou seja: não adiantava ocupar o quintal dos traficantes com uma polícia bandida. Não que a instituição seja criminosa, mas está povoada por maus elementos. Com o dedo leve no gatilho.
Há no Rio de Janeiro cerca de 1.300 favelas e bairros muito pobres. Segundo o ministro Jugmann, 850 deles são dominados pelo crime organizado. Uma população de 1.3 milhão de pessoas estaria sob o jugo do narcotráfico. Só este ano, mais de 100 policiais militares foram assassinados no Rio. Não sei o número exato de “civis” tombados no conflito, mas são centenas e centenas. Só em 2017, 632 pessoas foram atingidas por balas perdidas, de acordo com a Folha de S., Paulo, incluindo mulheres e crianças. Além do mais, pesquisas de opinião pública revelam que os pobres têm mais medo das forças da lei do que dos bandidos. É o caos!
Com os incidentes de hoje, o prefeito do Rio, o bispo evangélico Marcelo Crivella, voltou a pedir ações das Forças Armadas contra a violência que assola a cidade. Os políticos acham que os militares estão aí para dar uma desculpa pública para o desgoverno. Isto não só desagrada a caserna, como não tem tido resultados. Na verdade, os militares estão de saco cheio de agir para salvar a aparência de políticos pouco cofiáveis, que comprometem a imagem pública das Forças Armadas, especialmente o Exército e a Marinha.
É bom lembrar que o ex-governador Sérgio Cabral está preso por deslavada corrupção e que o Estado deve salários aos funcionários públicos. Se não construímos escolas e hospitais, seremos capazes de cuidar de quartéis e de tropas? O que falta mesmo são políticas de bem-estar social e redução das desigualdades. Sem isso, não há segurança que aguente, particularmente em um país onde o presidente e alguns ministros são acusados – justamente – de formação de quadrilha.