Condenação no TRF-4 destrói a candidatura de Lula e as esperanças de milhões de brasileiros. O ex-presidente ainda tem recursos, mas as chances de ir às urnas de outubro são mínimas. E ele pode ser preso em pouco tempo.

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Lula, sem perspectivas de concorrer.

                                    A decisão unânime do tribunal, por três votos a zero, limitou a capacidade de Lula recorrer da condenação a 12 anos e 1 mês de prisão em regime fechado. E ainda há uma multa milionária a pagar. A sentença dos desembargadores da corte federal de segunda instância, em Porto Alegre, foi uníssona. A ponto de parecer previamente combinada. Os votos concordavam nas conclusões, nas penas e nos elogios a Sério Moro. A trinca de juízes gaúchos agravou a pena de prisão em 2 anos e 7 meses (cerca de 29% a mais do que a decisão de Moro).

                                   Foi um duro golpe para a carreira e a biografia de um trabalhador nordestino que chegou ao poder pelo voto direto, após décadas de envolvimento com o sindicalismo e a política partidária. E o PT também recebeu um tiro mortal. A sessão do TRF-4 durou cerca de nove horas. Logo após a decretação das penas, que incluem 24 anos de impedimento a concorrer a empregos públicos e participação acionária em empresas, o PT divulgou uma nota oficial: Lula será registrado como candidato do partido em 15 de agosto. É uma declaração forte, corajosa, porém inócua. A sentença federal de Porto Alegre já determina a inelegibilidade de Lula, com base na Lei da Ficha Limpa. Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ouvidos pela imprensa, adiantaram que o campeão das pesquisas eleitorais é uma carta fora do baralho.

                                   A candidatura dele será impugnada, a menos que seja absolvido nos tribunais superiores, como o STJ e o STF. Isto é altamente improvável – e pode não haver tempo hábil. Basta um Gilmar Mendes da vida pedir vistas aos autos e está tudo perdido.

                                   Lula esteve em Porto Alegre ontem à noite. Falou para uma multidão de apoiadores. Hoje pela manhã (24 jan), por volta das 10 horas, chegava à sede do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, onde tudo começou 40 anos atrás. Disse a militantes e amigos que seria absolvido. Enganou-se. Vi o líder metalúrgico, duas vezes presidente, com camisa vermelha, dizendo que estava tranquilo e que teria três votos a favor da absolvição dele. Errou mesmo.

                                   Na verdade, a condenação de Lula e a provável prisão, em poucos meses, completa o ciclo conservador iniciado com a deposição parlamentar de Dilma Rousseff. O projeto conservador foi construído em torno de um documento chamado “Uma ponte para o futuro”, que Fernando Henrique Cardoso classificou de “uma pinguela”, acrescentando: “mas é o que temos”, como a concordar. O texto, supostamente atribuído ao vice-presidente, marcou o rompimento de Michel Temer e Dilma. Foi o ponto de partida da reação a 13 anos de poder do PT. E desencadeou a rebelião do “centrão” contra o modelo petista de governar. A “ponte” teve apoio da bancada do boi e da soja, da bancada da bala e da frente parlamentar evangélica no Congresso. Maioria.

                                   O projeto dos petistas e seus aliados preconizava um desenvolvimento econômico com distribuição de renda e justiça social. O crescimento econômico, na Era Lula, foi de 3,9% do PIB, na média. Mas o PT cometeu todos os pecados que poderia cometer. Contrariando os princípios da sua fundação, a partir dos sindicatos, da igreja católica, intelectuais de esquerda e movimentos sociais, envolveu-se com a porcaria circundante. Comprou votas de apoio e, no mínimo, fechou ou olhos à corrupção generalizada. Virou carne de vaca. E a punição veio no “Mensalão” e no desastre dos governos de Dilma Rousseff.

                                   De outra parte, o projeto conservador, que tende a continuar sem Lula nas eleições, inverte a logica petista. Trata-se de atender aos reclamos do grande capital, com vistas aos investidores nacionais e estrangeiros. Vende-se tudo o que for possível. Reduz-se o tamanho da máquina pública e coisas do gênero. Corta-se o dinheiro para investimentos sociais e coisas básicas como saúde, pesquisa, educação e segurança. A lógica deste método é simples: o mercado dará conta do desenvolvimento. E o resto é bobagem. Mas o resto é o populacho em geral.

                                    Com a condenação de Lula em segunda instância, o que o torna inelegível, a bolsa de valores bateu um recorde em negócios. E o dólar caiu. Foi a saudação do “mercado” à destruição da candidatura petista. Lula havia ameaçado convocar um plebiscito popular para revogar as reformas de Michel Temer, cujo objetivo é justamente ampliar o saldo da conta do déficit primário, que garante o pagamento da dívida pública para bancos e investidores. Um alívio.

                                 Michel Temer está bem longe da confusão brasileira, que o jornal The New York Time classificou de “um abismo para a democracia”. Está em Davos, na Suíça, onde participa do fórum econômico mundial. Disse à Globonews que está ali com objetivos empresariais, como quem não está preocupado com as emergências globais, como o aquecimento climático e o terrorismo. Quer apresentar aos investidores “o Novo Brasil”. Que está à venda.         

 

     

Sobre Carlos Amorim

Carlos Amorim é jornalista profissional há mais de 40 anos. Começou, aos 16, como repórter do jornal A Notícia, do Rio de Janeiro. Trabalhou 19 anos nas Organizações Globo, cinco no jornal O Globo (repórter especial e editor-assistente da editoria Grande Rio) e 14 na TV Globo. Esteve no SBT, na Rede Manchete e na TV Record. Foi fundador do Jornal da Manchete; chefe de redação do Globo Repórter; editor-chefe do Jornal da Globo; editor-chefe do Jornal Hoje; editor-chefe (eventual) do Jornal Nacional; diretor-geral do Fantástico; diretor de jornalismo da Globo no Rio e em São Paulo; diretor de eventos especiais da Central Globo de Jornalismo. Foi diretor da Divisão de Programas de Jornalismo da Rede Manchete. Diretor-executivo da Rede Bandeirantes de Rádio e Televisão, onde implantou o canal de notícias Bandnews. Criador do Domingo Espetacular da TV Record. Atuou em vários programas de linha de show na Globo, Manchete e SBT. Dirigiu transmissões de carnaval e a edição do Rock In Rio 2 (1991). Escreveu, produziu e dirigiu 56 documentários de televisão. Ganhou o prêmio da crítica do Festival de Cine, Vídeo e Televisão de Roma, em 1984, com um especial sobre Elis Regina. Recebeu o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1994, na categoria Reportagem, com a melhor obra de não-ficção do ano: Comando Vermelho – A história secreta do crime organizado (Record – 1994). É autor de CV_PCC- A irmandade do crime (Record – 2004) e O Assalto ao Poder (Record – 2010). Recebeu o prêmio Simon Bolívar de Jornalismo, em 1997, na categoria Televisão (equipe), com um especial sobre a medicina em Cuba (reportagem de Florestan Fernandes Jr). Recebeu o prêmio Wladimir Herzog, na categoria Televisão (equipe), com uma série de reportagens de Fátima Souza para o Jornal da Band (“O medo na sala de aula”). Como diretor da linha de show do SBT, recebeu o prêmio Comunique-se, em 2006, com o programa Charme (Adriane Galisteu), considerado o melhor talk-show do ano. Em 2007, criou a série “9mm: São Paulo”, produzida pela Moonshot Pictures e pela FOX Latin America, vencedora do prêmio APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte) de melhor série da televisão brasileira em 2008. Em 2008, foi diretor artístico e de programação das emissoras afiliadas do SBT no Paraná e diretor do SBT, em São Paulo, nos anos de 2005/06/07 (Charme, Casos de Família, Ratinho, Documenta Brasil etc). Vencedor do Prêmio Jabuti 2011, da Câmara Brasileira do Livro, com “Assalto ao Poder”. Autor de quatro obras pela Editora Record, foi finalista do certame literário três vezes. Atuou como professor convidado do curso “Negócios em Televisão e Cinema” da Fundação Getúlio Vargas no Rio e em São Paulo (2004 e 2005). A maior parte da carreira do jornalista Carlos Amorim esteve voltada para a TV, mas durante muitos anos, paralelamente, também foi ligado à mídia impressa. Foi repórter especial do Jornal da Tarde, articulista do Jornal do Brasil, colaborador da revista História Viva entre outras publicações. Atualmente, trabalha como autor, roteirista e diretor para projetos de cinema e televisão segmentada. Fonte: resumo curricular publicado pela PUC-RJ em “No Próximo Bloco – O jornalismo brasileiro na TV e na Internet”, livro organizado por Ernesto Rodrigues em 2006 e atualizado em 2008. As demais atualizações foram feitas pelo autor.
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  1. José Antonio Severo disse:

    Veja minha análise desapaixonada:

    Pressão sobre tribunal foi gol contra de Gleisi Hoffmann

    Foi apenas um gol contra. O jogo não terminou, mas já passa da metade do segundo tempo. A esquerda lulista perde por dois a zero: gol de Sérgio Moro, condenando o ex-presidente Lula à cadeia; o segundo gol foi ontem, contra, pela zagueira Geisel Hoffmann. Os jovens desembargadores não aceitaram a “pressão popular” e deram uma resposta pragmática. A bola agora foi para a marca do pênalti.
    A quarta feira de sangue converteu-se num anticlímax, pois se Lula teve a pena aumentada, não foi preso nem calado. Todos voltaram para casa sem uma resposta imediata. Não dá para misturar a lógica dos tribunais com o calor das grandes manifestações. Nenhuma mobilização aguenta um prazo processual.
    A continuar nessa levada, a partida termina em goleada: a esquerda leva mais um gol nos embargos, toma o quarto no STJ e, o placar final aumentar no Supremo . Então Lula irá para a prisão, talvez uma pena semiaberta depois de passar alguns meses na cadeia. Ou então foge para o Exterior, ganha um passaporte da ONU e ficará a vagar pelo mundo.
    A possibilidade de o Supremo de alguma forma salvar Lula é remota, mas possível. Esta possibilidade foi muito bem explorada jornalisticamente na matéria do divergente João Gabriel Alvarenga. Voltemos a ela.
    O STF é o último tribunal político do País. Todas as demais instâncias judiciais foram profissionalizadas e seus quadros preenchidos por concursos, por sinal muito rigorosos, demandando estudos e capacidade aos candidatos.
    O Supremo também pode entrar nessa vertente se passar a proposta do senador gaúcho Lasier Martins de escolha técnica dos ministros do STF. Até lá ainda temos esse plenário que se assiste pela televisão. Os militantes dos partidos que apoiam o ex-presidente contam com isto para reverter às sentenças. É possível, pois aquela Corte sempre votou com o politicamente correto, demonstrando sua flexibilidade a pressões externas. É o último recurso.
    Se isto acontecer os momentos finais dessa partida será dramático. De um lado militâncias estridentes procurando atemorizar as classes médias coxinhas acomodadas, e com isto dobrar o Judiciário; de outro a comunidade jurídica (OAB, advogados, juízes, promotores etc.) a defender o poder que conquistado, que se consubstanciaria na prisão do maior líder popular em ação no País. Será uma queda de braço sem precedentes. Como nunca na História deste País, diria Lula.
    Entretanto, a esquerda deveria mudar a tática do jogo, reposicionando-se e encontrando outro artilheiro o quanto antes. Mantidas as penas, Lula terá que, gradativamente, sair de campo. Com novas derrotas na Justiça seria um tanto arriscado continuar vociferando contra os Tribunais e seus magistrados. Sem ele, a esquerda fica como a seleção de Felipão sem Neymar.
    Muito interessante é especular sobre o cenário futuro, com Lula condenado. Será como foi com Perón, liberado da prisão pela multidão, criando a data sagrada do 17 de Outubro, o Dia da Lealdade Peronista? Perón venceu as eleições de 1945, escalou de presidente constitucional tornando-se ditador até ser deposto. Entretanto, assombrou a Argentina durante mais de 20 anos, até voltar senil para ser outra vez presidente, morrer no poder deixando no governo a vice-presidente, sua jovem mulher Isabelita, que fez mergulhar seu país na ditadura mais cruel da América Latina.
    Os juízes não pensam nisto. Pelo contrário: seu poder deriva da impermeabilidade. A pergunta é: esta força institucional da Justiça deriva de uma bolha da falência de uma geração de políticos, ou o Brasil se civilizou? Certamente a resposta a isto será mais um serviço que Lula prestará à História do País, essa “nunca antes vista” que então tomaria outra forma. O contrário seria o caudilhismo. Não duvidem: essa tal “classe política” que está aí, representando interesses e causas ameaçados, é capaz de tudo. Os juízes que se cuidem.

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